Rococó

27/09/2010 11:00

O rococó é um estilo que desenvolveu-se no sul da Alemanha e Áustria e principalmente na França, a partir de 1715, após a morte de Luís XIV. Também conhecido como "estilo regência", reflete o comportamento da elite francesa de Paris e Versailles, empenhada em traduzir o fausto e a agradabilidade da vida. O nome vem do francês rocaille (concha), um dos elementos decorativos mais característicos desse estilo, não somente da arquitetura, mas também de toda manifestação ornamental e de adereços. O estilo conheceu grande desenvolvimento entre 1715 e 1730, durante a regência de Filipe de Orléans.

 

Existe uma alegria na decoração carregada, na teatralidade, na refinada artificialidade dos detalhes, mas sem a dramaticidade pesada nem a religiosidade do barroco. Tenta-se, pelo exagero, se comemorar a alegria de viver, um espírito que se reflete inclusive nas obras sacras, em que o amor de Deus pelo homem assume agora a forma de uma infinidade de anjinhos rechonchudos. Tudo é mais leve, como a despreocupada vida nas grandes cortes de Paris ou Viena.

 

A arquitetura rococó é marcada pela sensibilidade, percebida na distribuição dos ambientes interiores, destinados a valorizar um modo de vida individual e caprichoso. Essa manifestação adquiriu importância principalmente no sul da Alemanha e na França. Suas principais características são uma exagerada tendência para a decoração carregada, tanto nas fachadas quanto nos interiores. As cúpulas das igrejas, menores que as das barrocas, multiplicam-se. As paredes ficam mais claras, com tons pastel e o branco. Guarnições douradas de ramos e flores, povoadas de anjinhos, contornam janelas ovais, servindo para quebrar a rigidez das paredes.

 

O mesmo acontecia com a arquitetura palaciana. A expressão máxima dessa tendência são os pequenos pavilhões e abrigos de caça dos jardins. Construídas para o lazer dos membros da corte, essas edificações, decoradas com molduras em forma de argolas e folhas transmitiam uma atmosfera de mundo ideal. Para completar essa imagem dissimulada, surgiam no teto, imitando o céu, cenas bucólicas em tons pastel. Na metade do século, o "estilo Pompadour" já constituiu uma variante do rococó: curvas e contra curvas animam as paredes e os ritmos decorativos, afirma-se a assimetria, a trama linear invade tudo. As Vilas construídas para a favorita de Luís XV sugerem a evolução de um gosto que se desenvolve com pequenas oscilações.

 

Os móveis, importantíssimo complemento da construção arquitetônica, assumem uma transcendência particular. De um lado isto decorre da exigência, de determinados arranjos. De outro lado a variedade cromática, devido ao emprego de madeiras raras marchetadas, ornadas de frisos dourados, é acompanhada pelo requinte de suas linhas. Acompanha tudo isso o gosto pelos bibelôs. Devido ao grande desenvolvimento decorativo, a escultura ganha importância. Os escultores do rococó abandonam totalmente as linhas do barroco. Suas esculturas são de tamanho menor. Embora usem o mármore, preferem o gesso e a madeira, que aceitam cores suaves. Os motivos são escolhidos em função da decoração. Até artistas famosos, principalmente aqueles ligados a manufatura de Sèvres se apressam a preparar para ela, desenhos e modelos. Em função de lembrança, do souvenir, os pequemos grupos representam cenas de gênero e narram, com linguagem espontânea e cores luminosas, episódios galantes, brincadeiras e jogos infantis.

 

Nas igrejas da Baviera surge o teatro sacro. Altares com iluminação a partir do fundo, decorados com cenários carregados de anjos, folhas e flores, são a referência ideal para cenas religiosas de uma inegável atmosfera de ópera.

 

Deve-se destacar também que é nessa época que surge com um vigor inusitado a indústria da escultura de porcelana na Europa, material trazido do Extremo Oriente, na esteira do exotismo tão em voga nessa época. Esse delicado material era ideal para a época, e imediatamente surgiram oficinas magistrais nessa técnica, em cidades da Itália, França, Dinamarca e Alemanha.

 

A pintura rococó deixa de lado os afrescos a fim de dar lugar aos arrases que pendem macios das paredes e torna íntimo e discretos os ambientes; aproveita os recursos do barroco, liberando-os de sua pesada dramaticidade por meio da leveza do traço e da suavidade da cor. Agora o quadro tem pequenas dimensões, passando a ser colocado nas entreportas ou ao lado das janelas, onde antes eram colocados os espelhos. Por vezes os quadros têm um lugar reservado: são os cabinets de pintura, onde se reúnem os entendedores para apreciar as obras.

 

O homem do rococó é um cortesão, amante da boa vida e da natureza. Vive na pompa do palácio, passa o dia em seus jardins e se faz retratar tanto luxuosamente trajado nos salões de espelhos e mármores quanto em meio a primorosas paisagens bucólicas, vestido de pastorzinho.

As cores preferidas são as claras. Desaparecem os intensos vermelhos e turquesa do barroco, e a tela se enche de azuis, amarelos pálidos, verdes e rosa. As pinceladas são rápidas e suaves, movediças. A elegância se sobrepõe ao realismo. As texturas se aperfeiçoam, bem como os brilhos.
Existe uma obsessão muito particular pelas sedas e rendas que envolvem as figuras. Os retratos de Nattier e as cenas galantes de Fragonard são as obras mais representativas desse estilo.

 

O material preferido para obter o efeito aveludado das sedas e dos brocados, a transparência das gazes e o esfumado das perucas brancas são os tons pastel. Esses pigmentos de cores diferentes, prensados na forma de pequenos bastões, ao serem aplicados sobre uma superfície rugosa vão se desfazendo e é preciso fixá-los com um líquido especial. Sem sombra de dúvida, é nesse período que a técnica do pastel atinge seu ponto máximo de excelência.

 

 

1. Watteau

 

Antoine Watteau nasceu em 10 de outubro de 1684, em Valenciennes, centro da região de Hainaut, recém-incorporada ao território francês pelas tropas de Luís XIV.

Seu talento se revelou já na infância: antes de completar dez anos de idade, Antoine rabiscava, a lápis ou a carvão, as coloridas quermesses de Valenciennes. Curiosamente, os mesmos temas que haviam inspirado seus predecessores flamengos — Bruegel, Bosch e Rubens — impressionavam também o menino, que povoava seu caderno com saltimbancos, palhaços, anões e mulheres barbadas.

Decididamente apaixonado pelo espetáculo da vida improvisada, Antoine logo abandonou os bancos da escola. Contava com a aprovação do pai, mestre-telheiro, que sonhava para o filho uma carreira rendosa e, sobretudo, livre da servidão do trabalho braçal. Confiou-o, então, ao pintor jacques-Albert Gérin, que, desinteressado, deixava o jovem num canto a copiar frisos gregos e romanos. Poucos anos depois, Gérin aproveitou a falta de pagamento para livrar-se daquele adolescente, que preferia encher os cadernos com "monstrengos" das feiras populares, em vez de decalcar os mármores do Partenon.

Assim, armado apenas do talento e da vontade de se firmar como artista, Watteau convenceu o pai a deixá-lo seguir seu caminho. E o caminho para qualquer jovem ambicioso da época levava a Paris, a capital cujo brilho e fausto chegavam até as províncias mais distantes.

Com uma pequena bagagem e mal preparado para enfrentar sem sofrimento o rigor do inverno de 1702, Antoine Watteau desembarcou em Paris. Contava apenas dezoito anos; no lenço cuidadosamente atado à cintura, sob as grossas calças de feltro, escondia algumas moedas de ouro.
Instalado numa pobre estalagem perto da atual ponte Saint-Denis, ele não tardou a encontrar trabalho: copiar estampas e pinturas célebres para os comerciantes de quadros e gravuras estabelecidos ao longo do Sena.

Embora esta fase inicial não tenha contribuído para a formação artística de Watteau, serviu de trampolim para sua vocação maior. Porque foi justamente por meio de uma de suas cópias menos fiéis, aquelas que os vendedores escondiam dos clientes, que Antoine acabou atraindo a atenção e a amizade do pintor Claude Gillot, que exerceria grande influência, tanto em sua vida como em sua obra. Encantado com o sotaque, com a afabilidade e com o entusiasmo do jovem, ofereceu-lhe trabalho. Assim, em vez de negociar imitações baratas, poderia pintar livremente para uma clientela rica e sofisticada. Mais que isso, pelas mãos de Gillot e de seus amigos nobres, Watteau desbravou, fascinado, um novo mundo: o teatro, que se transformaria num dos principais temas de sua criação. Era como dar brilho e magia aos pobres personagens que retratava nas feiras.

Mais tarde, o decorador do Palácio do Luxemburgo, Claude Audran, franqueou-lhe outro panorama inspirador: a paisagem simétrica dos jardins franceses, que serviria de fundo para suas cenas campestres. Audran também proporcionaria um contato decisivo com as telas de Peter Paul Rubens, que compunham o majestoso ciclo Maria de Médicis. Watteau preparou inúmeros desenhos e esboços a partir desses quadros, absorvendo, assim, em benefício de seu próprio estilo, alguns toques de Rubens, como o estilo brilhante e a riqueza das cores. Talvez pela afinidade espiritual derivada da mesma origem flamenga, talvez pelo contraste entre os personagens desse mestre, monumentalmente rudes, e suas próprias figuras, musicalmente etéreas, Watteau teve, com Rubens, suas lições definitivas.

Um dos pais do estilo Rococó na decoração, Audran, por sua vez, ainda possibilitou ao jovem pintor incluir-se no seleto grupo de artistas que executavam, sob sua orientação, desenhos e arabescos nas residências da aristocracia. Enquanto trabalhava para Audran, entre 1707 e 1708, Watteau revelou sua inventividade nas boiseries (revestimentos em madeira das paredes). No Château de la Muette, por exemplo, entre os motivos centrais de arabescos fantasiosos com temas mitológicos ou galanterias de pastores a camponesas, introduziu minúsculos motivos chineses ou siemescos (as chinoiseries e singeries) que seriam sucesso em toda a Europa.

Assim encorajado, em 1709 Watteau decidiu concorrer ao Prêmio de Roma — instituído pela Academia Real da França —, que oferecia uma viagem à Itália. Mas nada obteve. E, certamente desgostoso com seu insucesso, abandonou os amigos e o estúdio de Paris, voltando a Valenciennes. Foi um gesto de rebeldia pouco duradouro: dois meses depois, no início de 1710, ele refazia as malas para regressar a Paris. Nesse meio tempo, porém, nas vizinhanças de Valenciennes, cidade de fronteira, travavam-se batalhas sangrentas; Watteau fixou algumas imagens dessa situação, como a partida triste de um recruta, exercícios bélicos em pleno campo e encontros furtivos de soldados com moças da aldeia. Em Paris, onde os ecos da guerra chegavam amortecidos, suas telas agradariam a colecionadores e marchands.

De volta, Watteau retomou suas cenas de teatro; elas empolgavam pessoas refinadas, como o Conde de Caylus e o milionário Pierre Crozat. Hospedou-se, juntamente com seu discípulo Jean-Baptiste Pater (vindo de Valenciennes), em casa do marchand Sirois, e foi certamente por seu intermédio que conheceu Crozat, em cuja coleção de desenhos de Veronese, Tiepolo, Ticiano e outros encontraria a fonte de seu último e fecundo aprendizado — unia, assim, os temas de Rubens à vibração cromática dos coloristas venezianos. Aliás, foi o curador da coleção de Crozat, Charles la Fosse, quem patrocinou a segunda aproximação de Watteau com a Academia Real da França, em 1712. Impressionado com o artista, o comitê da Academia ofereceu-lhe a oportunidade de ali ingressar, abrindo um precedente ao permitir que escolhesse o tema de sua peça de ingresso: em 1717, Watteau apresentou seu A Peregrinação à Ilha de Citera, que recebeu a classificação de fête galante (festa galante) na Academia.

Considerado uma personalidade "difícil", Watteau foi de fato um homem irritável, introspectivo e inquieto. Era distante por natureza e a adulação de estranhos tornava-o impaciente. Como não se interessava por dinheiro, é provável que não desse o devido valor a seus quadros. Conta-se que certa vez trocou dois quadros por uma peruca, e ainda ficou apreensivo, acreditando que o negociante pudesse vir a sentir-se lesado.

Mas essa natureza, que se qualificou de "temperamental", certamente se agravava em conseqüência de uma enfermidade séria e incurável na época — a tuberculose —, que o afligiu durante a maior parte de sua vida e, finalmente, a abreviou. Não se sabe ao certo quando ele teve conhecimento de sua doença, mas é inegável que contagiou seus quadros, sombreando com um toque melancólico a alegria dos personagens em festa.

Em 1719, Watteau viajou para a Inglaterra em busca de um médico famoso, o dr. Mead. Mas o inverno severo desse país serviu apenas para agravar suas péssimas condições de saúde e, em 1720, Watteau já estava de volta a Paris, como hóspede de Edme Gersaint, o genro de Sirois. Também negociante de arte, Gersaint teve sua loja retratada na última obra-prima de Watteau. Pouco depois o artista mudava-se para uma casa de campo em Nogent. Pediu ainda ao amigo que vendesse todos os seus pertences, pensando em empreender uma derradeira viagem à sua terra natal; na verdade, não voltaria a rever Valenciennes.

Talvez pressentindo o fim próximo, movimentava-se constantemente, sempre irrequieto, e, segundo se conta, ainda em Nogent, teria destruído algumas pinturas eróticas e começado a trabalhar num Cristo na Cruz. Gersaint o visitava com freqüência e foi em seus braços que Watteau morreu, em 18 de julho de 1721, aos 37 anos. Jovem demais para um talento que ainda teria muito a expressar.